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quarta-feira, setembro 02, 2020

DOENÇAS CAUSADAS POR PROTOZOÁRIOS 01 - MALÁRIA

DOENÇAS CAUSADAS POR PROTOZOÁRIOS 01 – MALÁRIA.

 

A malária é uma zoonose causada por protozoários apicomplexos e transmitida por mosquitos já conhecida há séculos e cujo nome, mal’aria, significa ar ruim em italiano, por conta de as pessoas acharem que se pegava pelo ar em regiões próximas aos pântanos. É uma doença que ocorre primordialmente nas regiões tropicais dos continentes americano, africano e asiático e já acomete os humanos há milênios. Inclusive, acredita-se que pode ter sido a responsável pela eliminação de outros gêneros de primatas hominídeos e influenciado na evolução da espécie humana.

 

Os causadores da doença são protozoários do supergrupo Chromalveolata, filo Apicomplexa, chamados de maneira simplificada de apicomplexos. Nesse caso são os apicomplexos pertencentes ao gênero Plasmodium, sendo as duas espécies mais comuns o P. vivax e o P. falciparum (parecido com uma foice), esse último, causador da forma grave da doença, capaz de levar o acometido ao coma e até à morte. Mas há várias outras espécies de plasmódios capazes de causar malária em humanos, como o P. malariae e o P. ovale, dentre outros.

 

Os apicomplexos são protozoários caracterizados por possuírem um conjunto de organelas chamado de complexo apical em uma das suas extremidades (daí o nome do filo). Essas organelas têm a função de permitir ao protozoário adentrar e parasitar as suas células alvo. Além desse complexo apical, os apicomplexos também possuem um plastídeo modificado chamado de apicoplasto, que se acredita ser resultante de uma endossimbiose secundária (ele tem quatro membranas) e que atue no metabolismo do ferro e dos lipídeos. Essa organela é essencial para a sobrevivência da célula e, por isso, é alvo nas pesquisas que objetivam desenvolver medicamentos contra a malária.

 

 

Os vetores dos plasmódios são vários mosquitos pertencentes ao gênero Anopheles (no Brasil, encontramos, por exemplo, o A. darlingi, A. aquasalis, A. bellator e o A. cruzi). Esses mosquitos têm o hábito de picar preferencialmente à noite e com o corpo inclinado para cima. No ciclo de vida do protozoário, os mosquitos são o hospedeiro definitivo (cuidado que isso é um pega!), ou seja, o organismo parasitado no qual ocorre reprodução sexuada/gamética. Os humanos são hospedeiros intermediários, pois neles só ocorre reprodução assexuada/agamética desses protozoários. (É bom destacar que em certos parasitas, como o Toxoplasma gondii, ocorrem os dois modos de reprodução, gamética e agamética, no hospedeiro definitivo, em outro local veremos mais sobre a toxoplasmose).

 

A imagem abaixo ilustra o ciclo de vida do parasita. Em resumo: um mosquito fêmea infectada, ao picar alguém, transmite formas haploides do protozoário chamadas de esporozoítos (n = 7), que estavam alojados em suas glândulas salivares. Esses esporozoítos infectarão as células do fígado, onde irão gerar outra forma haploide, os merozoítos, por meio de esquizogonia (nessa modalidade, o núcleo se divide várias vezes e posteriormente a célula sofre as divisões citoplasmáticas originando as células filhas). Esse estágio no fígado é praticamente assintomático e pode durar de 5 – 16 dias, mas os protozoários também podem permanecer dormentes nas células do fígado durante anos. Os merozoítos são liberados das células do fígado e agora infectarão os eritrócitos/hemácias, as células vermelhas do sangue. Nas hemácias ocorre uma nova fase de reprodução agamética, na qual são gerados mais merozoítos e também, formas chamadas de gametócitos. Os merozoítos e gametócitos, após se multiplicarem e serem liberados, rompem as hemácias de 48-48h ou 72-72h, dependendo da espécie de plasmódio, o que promove a liberação de toxinas e gera intervalos regulares de febre, que são o sintoma mais característico da malária. Ao picar uma pessoa infectada, uma mosquita pode ingerir os gametócitos, que irão gerar zigotos (2n = 14) na parede do aparelho digestório do animal, a fase de reprodução gamética. Esses zigotos irão sofrer meiose e gerar esporozoítos, que podem ser inoculados em uma pessoa que a mosquita venha a picar. Essa fase de geração de esporozoítos nos mosquitos pode durar de duas a três semanas.

 


Dentre os sintomas mais comuns da malária estão as náuseas e vômitos, que antecedem os eventos regulares de febre, que podem ou não estar acompanhada de calafrios. No caso da malária grave, causada primordialmente pelos P. falciparum, a pessoa pode ter convulsões, insuficiência renal, alterações no estado de consciência e entrar em estado de coma. A forma grave é devida em parte à capacidade das hemácias infectadas formarem coágulos e gerar hipóxia e a liberação de toxinas celulares no local, o que pode inclusive afetar o cérebro. A forma grave da doença é a responsável pela maior parte dos óbitos. Estima-se que em 2015 a doença causou 438000 óbitos e em 2017, 620000. A maior parte são crianças no continente africano.

 

O tratamento da doença é feito com medicamentos específicos, como a quinina, cloroquina e outros. Digno de nota é que as populações de parasitas têm adquirido resistência contra essas substâncias e que, mesmo sem medicamentos, os sintomas da forma não grave ou não complicada da doença podem desaparecer em duas semanas, porém, por conta de os protozoários permanecerem em estado latente, esses sintomas podem persistir reincidindo por anos.

 

A prevenção e o controle consistem basicamente em combater os mosquitos vetores de maneira a evitar ser picado, como utilizar redes de proteção nas janelas das casas, redes sobre as camas, utilizar roupas longas, que dificultem as picadas, utilizar repelentes, pulverizar as regiões afetadas com vistas a matar os mosquitos vetores e ações nos criadouros dos mosquitos, que depositam seus ovos em águas limpas. Pode-se, por exemplo, limpar as margens de lagoas. 

 

 

Há pesquisas no intuito de desenvolver mosquitos transgênicos e analisar o efeito da liberação deles no ambiente. Por exemplo, há mosquitos Anopheles machos alterados geneticamente capazes de gerar praticamente descendentes também machos e com baixa expectativa de vida, o que reduz a população de fêmeas em uma região, prevenindo a doença. Obviamente, esse tipo de abordagem suscita muitas discussões no âmbito da bioética, sobre os efeitos ambientais de se agir no sentido de eliminar um organismo de um ecossistema.

 

Ainda no âmbito da prevenção, é possível tomar medicamentos de forma preventiva, como é o caso da cloroquina, que pode ser utilizada antes de se viajar para uma região onde a malária é endêmica. Quanto às vacinas, ainda não há vacina eficaz e comercializável para prevenir a doença.

 

REFERÊNCIAS:

 

https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422008000500060

https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902010000100006&lng=en&nrm=iso

http://www.fiocruz.br/ioc/media/malaria%20folder.pdf

https://saude.gov.br/saude-de-a-z/malaria

https://en.wikipedia.org/wiki/Malaria

https://pt.wikipedia.org/wiki/Anopheles

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6159572/

https://www.malariasite.com/life-cycle/

https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/2013/11/28/noticias-saude,193389/descoberta-substancia-que-interfere-nos-estagios-do-parasita-da-malari.shtml

https://www.cdc.gov/malaria/about/biology/index.html

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK8584/

https://www.cdc.gov/malaria/travelers/drugs.html

https://www.chemone.com.br/mosquitos

https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2014/06/mosquitos-transgenicos-sao-criados-para-combater-malaria.html