A REPLICAÇÃO DO DNA
Maximiliano Mendes
A replicação do
DNA é o processo de Síntese de novas cadeias ou “fitas” de nucleotídeos de DNA que ocorre antes
da divisão celular, na fase S da interfase e permite que as células filhas
tenham a mesma quantidade de moléculas de DNA cromossomal da célula mãe. A
partir de uma molécula de DNA, obtêm-se duas, por isso o processo também é
chamado de duplicação.
Veremos aqui um resumo simplificado e generalizado do processo:
Inicialmente um complexo enzimático contendo a enzima helicase se liga à molécula de DNA em
uma região, uma sequência de nucleotídeos, chamada origem de replicação. Um cromossomo circular bacteriano tem
normalmente apenas uma origem de replicação, ao passo que as moléculas de DNA maiores,
como as dos cromossomos, têm várias. A enzima helicase
separa as duas cadeias de DNA: ocorre a quebra das ligações de hidrogênio que
as mantinham unidas.
Helicase (representada pelo zíper) separando as
duas cadeias de DNA.
Aqui nesse vídeo se pode ver um modelo da helicase atuando:
Em seguida, as chamadas proteínas
de ligação à cadeia simples (SSBP – single
strand binding proteins) se ligam às cadeias separadas e impedem que elas
voltem a se unir (na imagem abaixo elas são representadas pelos clipes).
Antes que a replicação propriamente dita aconteça, ocorre a
ligação de uma enzima chamada primase,
que sintetizará um fragmento de cadeia simples de RNA, chamado primer
ou iniciador de RNA, pareado ao DNA
e com nucleotídeos cujas bases nitrogenadas são complementares às da cadeia de
DNA que serviu de molde. Isso é necessário para que haja a ligação do complexo
enzimático DNA polimerase, responsável por sintetizar uma nova cadeia de DNA: a
DNA polimerase não consegue iniciar a síntese de uma nova cadeia de DNA do
“zero”, o que ela faz é continuar a sintetizar uma cadeia que já existe, por
isso tem de haver esse iniciador. Inicialmente apenas uma primase se liga em
apenas uma das cadeias, porém, posteriormente, mais primases se ligarão à outra
cadeia de DNA. Após a síntese do iniciador de RNA, a primase se
desliga/dissocia da molécula de DNA.
Agora o complexo enzimático responsável pela síntese de
novas cadeias de DNA, contendo a enzima DNA
polimerase se liga à cadeia de DNA, na ponta do iniciador de RNA, e começa
a fazer a leitura das bases nitrogenadas da cadeia de DNA que serve de molde,
adicionando nucleotídeos com bases
nitrogenadas complementares à nova cadeia que está sendo sintetizada (lembre-se de que Adenina pareia com Timina e
Citosina com Guanina). Em E. coli, a
taxa na qual as DNAs polimerases adicionam nucleotídeos à cadeia em crescimento pode chegar até 1000 nucleotídeos por segundo, ao passo que nas nossas células é de 50-100 por
segundo.
A síntese das novas cadeias de DNA requer bastante energia, fornecida pelos próprios nucleotídeos utilizados na síntese,
pois eles são trifosfatos (ATP, CTP, GTP e TTP, contendo desoxirribose e não
ribose) e, por conta disso, pode haver a liberação da energia contida em duas
ligações entre grupos fosfatos. Quando já estão constituindo as cadeias de DNA,
os nucleotídeos são monofosfatos.
E assim a síntese prossegue nas duas cadeias da molécula de
DNA. Note que a nova cadeia que está sendo sintetizada na parte de cima da
figura é produzida continuamente, pois, uma vez ligado à cadeia de DNA, o complexo DNA
polimerase só se desliga ao término do processo de replicação, por isso, essa
cadeia é chamada contínua e só
necessita de um primer. O mesmo não
ocorre na cadeia que está sendo sintetizada na parte de baixo da figura. Nesse
caso, é preciso que a helicase aos poucos vá abrindo a molécula de DNA mãe para
que as DNA polimerases possam se ligar na porção que acabou de ter suas duas
cadeias separadas (parte da direita da figura). Assim, essa cadeia de baixo é
sintetizada de maneira descontínua, requerendo a síntese de vários primers de RNA e a ligação de várias DNA polimerases. Por isso é chamada cadeia descontínua.
Cada fragmento da cadeia descontínua é chamado de fragmento de Okazaki. Antes do término do processo, outras enzimas
irão remover os primers de RNA,
adicionar nucleotídeos de DNA e ligar todos os fragmentos das novas cadeias.
De maneira simplificada, o motivo pelo qual uma das cadeias é sintetizada de maneira contínua e a outra não é que as duas cadeias da molécula de DNA são antiparalelas: cada cadeia de nucleotídeos tem uma extremidade que termina no grupo fosfato do nucleotídeo (5' fosfato ou 5' OPO3-), enquanto a outra extremidade termina no grupo hidroxila pertencente à pentose (3' OH). Veja a imagem a seguir:
Como mencionado, a DNA polimerase não inicia uma cadeia do zero, ela continua a síntese a partir de uma cadeia pré-existente, por isso há a necessidade dos iniciadores de RNA. O detalhe a mais é que as DNA polimerases também precisam de uma extremidade 3' OH para se ligar, então, uma das cadeias é sintetizada de maneira descontínua, na medida em que mais desses iniciadores vão sendo gerados e fornecendo terminais 3' OH para que as DNA polimerases se liguem. Veja a imagem a seguir. Observe que as DNA polimerases leem as cadeias de DNA molde (na imagem, na cor azul escura) no sentido 3' para o 5' delas, ao passo que sintetizam as novas cadeias (em azul claro) no sentido 5' para o 3'.
A imagem mostra um resumo da replicação do DNA, mostrando algumas das principais enzimas responsáveis pelo processo e como as duas cadeias são sintetizadas.
Enfim, ao término do processo, obtêm-se duas novas moléculas
de DNA a partir de uma. Cada uma das novas moléculas têm uma cadeia
nova, que acabou de ser sintetizada, e uma cadeia velha, da molécula mãe, que serviu
de molde para a síntese da cadeia nova. Devido ao fato de que as moléculas
novas de DNA possuem uma cadeia velha e uma nova, a replicação é dita semiconservativa. (Além disso, devido ao fato de que uma das cadeias é sintetizada de maneira descontínua, também se pode dizer que a replicação também é semidescontínua).
Parece simples, mas nem tanto, óbvio. Inclusive é conveniente mencionar sobre o experimento de Meselson & Stahl, realizado em 1958, no qual se demonstrou que a replicação é semiconservativa (por que é um assunto bom para cair nas provas e cai mesmo). Em resumo, nesse experimento, inicialmente os pesquisadores cultivaram E. coli em meio contendo 15N, o isótopo pesado do nitrogênio (tem um nêutron a mais). Esse isótopo foi incorporado às bases nitrogenadas dos nucleotídeos de maneira que as moléculas de DNA passam a ser "pesadas". Em seguida, algumas dessas primeiras bactérias foram cultivadas em meio contendo o isótopo 14N e logo após o primeiro ciclo de replicação do DNA essas moléculas foram isoladas e analisou-se a densidade delas em uma centrífuga e elas também foram comparadas com a densidade das moléculas de DNA pesadas das primeiras bactérias e com as moléculas de DNA de bactérias cultivadas em 14N por várias gerações (DNA "leve"). O resultado foi que as moléculas de DNA das bactérias cultivadas em 15N e que passaram por um ciclo de replicação em meio com 14N apresentam moléculas de DNA com densidade intermediária, pois as cadeias novas sintetizadas nesse primeiro ciclo de replicação incorporam os nucleotídeos contendo o isótopo 14N, porém, conservam uma cadeia mãe, cujos nucleotídeos possuem o 15N. Veja a imagem abaixo.
Para finalizar é bom destacar que as DNA polimerases são capazes de efetuar uma checagem de
erros caso tenham adicionado um nucleotídeo cuja base nitrogenada não seja o
par correto do que foi lido na cadeia mãe. Caso isso ocorra, elas removem o
nucleotídeo mal pareado e o substituem por um que forme o par de maneira
correta. Caso os nucleotídeos mal pareados escapem desse mecanismo de reparo,
ainda há um segundo, no qual outras enzimas removem o(s) nucleotídeo(s) mal
pareado(s) para que uma DNA polimerase possa acrescentar os que formem pares de
maneira adequada. Esse sistema de
reparos é bastante eficaz e a taxa de erros é estimada em um nucleotídeo a
cada 1 bilhão, mas claro, os diversos agentes mutagênicos podem aumentar essa
taxa.
O vídeo abaixo mostra um modelo resumido do processo. Tem legendas em língua portuguesa (tem de acionar):
REFERÊNCIAS
Berg, JM et al. Biochemistry. 8th ed. WH Freeman. 2015.
Campbell, Reece et al. Biologia. 8ª Ed. Artmed. 2010.