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segunda-feira, fevereiro 01, 2021

SISTEMÁTICA E TAXONOMIA - CLASSIFICAÇÃO

Sistemática e taxonomia.


Se você for o dono de um supermercado sabe que se os produtos forem dispostos aleatoriamente nas prateleiras, o gerenciamento e as vidas dos clientes, que terão de passar mais tempo procurando o que querem, serão prejudicados. Tendo isso em vista, quando se tem muitos itens para se gerenciar e estudar é essencial adotar um sistema para organizá-los. No tocante à diversidade da vida, há uma quantidade enorme de organismos diferentes, sendo assim, é essencial que sejam categorizados. 




 Esta Foto de Autor Desconhecido está licenciado em CC BY-NC


“A sistemática pode ser definida como o estudo dos tipos e diversidade de organismos e das relações entre eles. A taxonomia, por outro lado, é a teoria e prática de identificar, descrever, nomear e classificar os organismos. A classificação é o arranjo dos organismos em grupos, os táxons (plural: taxa), com base nas relações entre eles.” (Fonte.)

 

A sistemática tem como objetivos, descrever a biodiversidade na forma de catálogos de espécies, desenvolver os critérios para se organizá-la e compreender os processos responsáveis pela geração de diversidade. A taxonomia é a forma pela qual a sistemática apresenta os seus resultados.


Vamos considerar, por exemplo, a forma como a sua família organiza os diversos produtos adquiridos em um supermercado. A sistemática seriam os critérios que vocês utilizam para organizar os produtos: limpeza, alimentos a serem guardados na geladeira, no freezer, na dispensa… A taxonomia, por sua vez, seria o resultado final da organização. Você, ao pegar um saco de arroz, identifica neste produto determinadas características que o permitem concluir que ele deve ser armazenado numa dispensa e não num freezer. Essa matéria é útil para que você entenda melhor os motivos pelos quais seguimos uma determinada sequência quando estudamos os grupos de seres vivos e quais são as relações entre eles.


De maneira geral e simplificada podemos dizer que os organismos são organizados primordialmente de acordo com as suas características estruturais/anatômicas e genômicas.


 



Na imagem vemos, à esquerda, vários representantes da família dos canídeos, na direita, apenas as raposas. Em grande parte, as categorias taxonômicas são baseadas nas características anatômicas, que inclusive refletem as informações dos genomas. Perceba que as raposas são mais semelhantes entre si do que com o resto dos canídeos, que por sua vez são mais semelhantes entre si do que com os felídeos (a família dos gatos). A classificação é baseada nesses tipos de dados e raciocínio.


Desde a antiguidade já havia sistemas de classificação, que foram sendo modificados ao longo do tempo, em resposta ao aumento do conhecimento científico e para se ajustar à mudança de paradigma criacionista fixista para um evolucionista. Alguns exemplos:

 

O sistema de Aristóteles, da Grécia antiga, que classificava os organismos em animais e plantas. Os animais de acordo com o ambiente em que viviam (voadores, nadadores…), as plantas de acordo com o critério tamanho (ervas, arbustos e árvores) e também os animais como tendo sangue ou não.

O sistema de Agostinho de Hipona, do Século IV, cujo critério de classificação era a utilidade que os seres vivos tinham para a espécie humana (úteis, nocivos e indiferentes).

O sistema de Lineu, do Século XVIII, cujo critério era baseado nas características estruturais e anatômicas dos seres vivos. Lineu é considerado o pai da taxonomia, pois propôs as categorias taxonômicas, Reino, Filo, Classe, Ordem, Família, Gênero e Espécie e também o sistema de nomenclatura binomial.

O sistema de Whittaker, do Século XX, baseado em cinco reinos, e que leva em consideração as relações de parentesco evolutivo entre os organismos.



 

Sistema de classificação de Whittaker.

Esta Foto de Autor Desconhecido está licenciado em CC BY-SA-NC



Sendo um sistema hierárquico, a categoria taxonômica ou táxon básico é a espécie: grupo de populações cujos indivíduos, em geral, apresentam características semelhantes e são capazes de cruzar e produzir descendentes férteis, em condições naturais, estando reprodutivamente isolados de indivíduos de outras espécies.


Os outros táxons são (exemplificando a espécie humana):


Reino – Animalia

Filo – Chordata

Classe – Mammalia

Ordem – Primates

Família – Hominidae

Gênero – Homo

Espécie – sapiens

 

Palavra mnemônica: ReFiCOFaGE

 

Também existem sub- e super-categorias (ex: superordem e subgênero). Além destes, acima da categoria Reino, também há uma categoria chamada Domínio em classificações mais recentes:

 

Eukarya: compreende os vários reinos de organismos eucariontes.

Archaea: arqueas.

Bactéria: bactérias.

 



O sistema de classificação em domínios foi inicialmente proposto por Carl Woese em 1990, de maneira a representar melhor as relações filogenéticas entre os vários organismos procariontes.


A palavra mnemônica passa a ser, então: DoReFiCOFaGE. Cuidado pra não confundir com as notas da escala musical.


As espécies de seres vivos são nomeadas de acordo com um sistema de nomenclatura binomial (introduzido por Lineu) que segue a regra Gênero epíteto:

 

O nome do gênero seguido do epíteto e ambos devem ser destacados do resto do texto (em itálico, negrito ou sublinhado).

O nome do gênero sempre vem com a inicial maiúscula e o epíteto com a inicial minúscula.

Os nomes dos organismos devem ser escritos de forma latinizada. (Não pode ser algo do tipo: Gatinho lindo). Como o latim é uma língua morta, espera-se que não seja mais modificada, o que facilita a comunicação científica. Por exemplo, os pumas também podem ser conhecidos por vários outros nomes, como onça parda, suçuarana, leão da montanha e outros. Porém, em comunicação científica a espécie é Puma concolor.

Quando aparecer pela primeira vez no texto, o nome deve ser escrito por completo, e depois pode se abreviar o nome genérico: Canis familiaris > C. familiaris.

Além disso, o nome do gênero pode ser escrito de forma isolada, ao passo que o da espécie não: Posso escrever apenas Canis, ou Canis sp., sem especificar mais que isso.

 

A sistemática atual, assim como as ciências biológicas em geral, é baseada na biologia evolutiva e na descendência comum universal (um primeiro ser vivo, simples e primitivo, é o ancestral de todas as formas de vida existentes hoje no planeta). Sendo assim, as classificações, na verdade, são genealogias, exibindo as relações de parentesco entre os seres vivos. Vejamos alguns conceitos importantes nesse âmbito.


 


Diagrama mostrando uma árvore da vida, a genealogia dos organismos.


Algumas das principais evidências em favor da ocorrência dos processos evolutivos são:

 

Fósseis: restos ou vestígios de seres que viveram em épocas remotas. Mostram que nosso planeta já foi habitado por espécies distintas das atuais, e que foram as ancestrais das atuais.

Semelhanças entre os embriões dos vertebrados: evidenciam a descendência em comum.

Órgãos homólogos: órgãos que têm a mesma origem embrionária e desenvolvimento em espécies diferentes. Apesar disso em alguns casos, podem desempenhar funções distintas em espécies distintas, como os membros anteriores de vertebrados terrestres e as asas de morcegos. (Órgão análogo: órgão que desempenha a mesma função em certas espécies, apesar de ter origens embrionárias distintas. Por exemplo: asas de aves, insetos e de morcegos.)

Semelhanças entre sequências de ácidos nucléicos e proteínas: quanto mais próximo o parentesco evolutivo, maiores tendem a ser as similaridades entre as sequências de bases nitrogenadas dos genes de organismos de espécies diferentes.


 


Imagens mostrando alguns órgãos homólogos, fósseis e embriões de vertebrados, evidências do processo evolutivo.

 

Acredita-se que os principais mecanismos capazes de terem gerado toda a biodiversidade foram:

 

Mutações (= mudanças) no material genético dos seres vivos, gerando novos genes e informações e, assim, permitindo o aumento na variabilidade e na complexidade dos organismos.

Seleção natural: nem todos os organismos têm a mesma capacidade de se reproduzir e deixar descendentes. Em um determinado ambiente os organismos com as características mais favoráveis têm maior potencial para sobreviver e gerar mais descendentes, logo, propagam os seus genes de maneira mais eficaz (esses indivíduos tem maior fitness), ao passo que outros genes podem até desaparecer da população.


Esses processos permitem que as populações de organismos evoluam no sentido de se tornar mais aptas a sobreviverem em seus ambientes e, ao longo das gerações, geram diversidade e novas espécies.


A adaptação é a capacidade de os seres vivos se ajustarem ao ambiente. Pode ser um processo de ajustamento individual (homeostase), ou de uma espécie ao ambiente no curso da evolução (adaptação evolutiva).


O processo de formação de novas espécies é chamado de especiação. Podemos, de maneira simplificada afirmar que a especiação ocorre via anagênese e cladogênese (atualmente há nomenclaturas distintas, contemplando processos distintos, veja aqui).


Na anagênese, mais rara, às vezes também referida como especiação simpátrica, ocorre que em uma determinada população, ao longo das gerações, as mutações se acumulam até que em um determinado momento as populações atuais tenham se modificado tanto ao ponto de poderem ser consideradas espécies distintas daquelas ancestrais. Um exemplo é o que pode ter havido, pelo menos em parte, na linhagem dos cavalos, referente ao aumento do tamanho corporal e o desenvolvimento de outras adaptações.




 


A cladogênese, às vezes também referida como especiação alopátrica, abrange processos naturais capazes de separar uma população original em duas ou mais e, a partir daí, essas populações evoluem e podem gerar novas espécies. É o caso, por exemplo, de uma catástrofe natural fragmentar uma ilha e isolar as populações, que poderiam gerar novas espécies.


 


Esquema representando a especiação via cladogênese. Imagem: Wikipedia. 


 


Comparação entre a cladogênese e a anagênese. 

Imagem: facinatingamazinganimals.wordpress.com


As árvores filogenéticas são diagramas que organizam e relacionam os seres vivos de acordo com o parentesco evolutivo entre eles. Atualmente há dois métodos principais em Sistemática:

 

Fenética: classificação baseada no número de características morfológicas entre os seres vivos, mesmo que isso não reflita a história evolutiva de um grupo. Também chamada de taxonomia numérica.

Filogenética: classificação baseada nas relações de parentesco e história evolutiva dos organismos.

 

A filogenética utiliza-se da cladística, método que procura estabelecer relações de parentesco evolutivo pela escolha criteriosa de características que realmente indiquem a ancestralidade comum entre os grupos. Os cladogramas são diagramas que mostram as relações filogenéticas entre os grupos de seres vivos considerados. A construção do cladograma é baseada em dois tipos de características:

 

Apomorfias: são as novidades evolutivas ou características derivadas, não presentes no ancestral. Em relação às apomorfias também temos as:

Plesiomorfias: são as características primitivas, mais antigas na linhagem.

 

Exemplo: considerando os mamíferos e os répteis, as glândulas mamárias seriam uma apomorfia, uma novidade dos mamíferos, ao passo que a presença de um endoesqueleto ósseo seria uma plesiomorfia, uma característica presente em ambos os grupos e no ancestral.



 

Imagem mostrando um cladograma possível e simplificado da linhagem dos cordados. No cladograma, a característica mais primitiva mostrada (a plesiomorfia) é a presença das vértebras, as outras, em relação a ela, são novidades evolutivas (apomorfias). 


Um clado ou grupo monofilético, é um grupo de organismos e o ancestral comum mais recente deles. Por exemplo, na imagem acima, as aves, crocodilianos, lagartos, cobras, tuataras, tartarugas e jabutis, ou seja, os répteis e as aves, formam um grupo monofilético. No entanto o grupo “répteis”, como exclui as aves, é chamado de grupo parafilético, inclui-se um ancestral comum, mas nem todos os descendentes dele. Os grupos polifiléticos são aqueles em que há um grupo de organismos e mais de um ancestral, sendo pelo menos um ancestral não comum a todos, ou então, grupos de organismos que não compartilham um ancestral comum direto. Se considerássemos, por exemplo, os animais homeotérmicos, grupo artificial que abrange mamíferos, aves, alguns peixes e alguns dinossauros, poderíamos ter um grupo polifilético.

 


Na imagem comparam-se os grupos monofilético (clado), polifilético e parafilético.


Nos cladogramas, a base representa o passado enquanto o topo representa o presente. Quando se mostram organismos localizados abaixo do topo, isso significa que o grupo é extinto. Cada ramificação é chamada de nó e representa o ponto onde ocorreu o evento de especiação e quando viveu o último ancestral comum de dois ramos.


Os principais reinos de seres vivos:

 

Uma das formas mais fáceis de se visualizar os reinos de seres vivos é o sistema de classificação proposto por Whittaker e modificado por Margulis e Schwartz, de 5 reinos. São eles:

 

Monera: “reino” dos organismos procarióticos. Lembrando que, atualmente os procariontes são pertencentes aos domínios Bacteria e Archaea e o domínio é uma categoria acima do reino.

Protoctista ou Protista: protozoários (unicelulares, eucarióticos e heterotróficos) e algas (uni ou pluricelulares, eucarióticos e autótrofos fotossintetizantes).

Fungi: fungos (uni ou pluricelulares, eucarióticos e heterótrofos).

Plantae: plantas (pluricelulares, eucarióticos e autótrofos fotossintetizates).

Animalia: animais (pluricelulares, eucarióticos e heterótrofos).

 

Os vírus são um caso à parte, pois são acelulares. Sendo assim, não apresentam metabolismo próprio e são obrigatoriamente parasitas intracelulares. Como não sabemos definir se são ou não vivos, chamamos os vírus de entidades. Não obstante, também podem ser classificados em categorias taxonômicas, apesar de os nomes dos vírus não seguirem as regras da nomenclatura binomial dos organismos.


Referências: 


Livros de biologia da Sônia Lopes, Amabis, Campbell e várias entradas sobre o tema na Wikipedia e Enciclopaedia Britannica.